15 novembro 2006

O ZÉ E O MINOR

O RAPTO

O que aqui vos vou contar, é a história de um rapto, no qual participaram dois amigos quase inseparáveis, um bastante bonito que se chamava “Minor” e outro bastante jovem na inocência das suas dezanove primaveras que atendia por “Zé”.
Para onde ia o Zé, ia o Minor e vice-versa ou quase. Digo quase porque como é bom de ver, o Zé não se atrevia a levar o Minor para a cama, nem tão pouco para a sala de aulas, nem tão pouco ainda para dentro do corredor da entrada de um prédio lá para os lados da Aldeia, onde morava uma certa moça.
Mas, em todas estas situações podem estar certos de que o Minor não andaria muito longe do Zé.
Na verdade, o Minor só estava realmente longe, embora perto fisicamente, nos sonhos do Zé.
Aí sim, o Zé esquecia-se completamente do Minor. Bom mas isso são contas de outro rosário que também não interessam para esta história. Ou interessam?
Voltamos ao rapto que é a razão destas linhas.
Decorria quente o mês de Agosto nos finais do verão de 1970, quando aconteceu a história que vos quero contar.
O Zé, de há uns tempos para cá, levava amiudadamente o seu amigo Minor até à Aldeia porque estava interessado numa certa moça que lá morava.
Nas tardes noites das Quartas, Sábados e Domingos, (naquele tempo os namoros faziam-se nestes dias), era certo e sabido que os dois por lá andavam, um na esperança de poder estar um pouco à conversa com a moça e o outro na sua condição de inseparável amigo transportava-o incondicionalmente até onde fosse preciso. Bom, não se sabe bem se o Minor tinha ou não o conhecimento exacto, desta história, mas o Zé, já conversava com a moça há algum tempo, o namoro tinha começado no Carnaval do ano anterior, quase ás escondidas e depois continuado por cartas e mensagens secretas, transportadas desde Faro até à Aldeia, pela irmã da moça porque naquele tempo, os namoros eram coisa séria e careciam da autorização dos pais da moça.
Finalmente no início de Agosto, o casal de namorados decidiu-se a pedir a necessária autorização para oficializar o namoro.
A mãe da moça disse que quanto a ela tudo bem, desde que o pai autorizasse. Mas, o pai estava emigrado em França. Foi necessário escrever ao homem contando o que se passava e pedindo a sua concordância.
Enquanto aguardavam pela resposta o namoro foi continuando, mas à porta de casa, como mandavam as regras, sempre na presença do Minor e com supervisão da mãe da moça que do alto da janela do 1º andar vigiava o jovem par.
Á medida que o tempo ia passando o jovem casal ficava mais ansioso porque a resposta do pai da moça, demorava a chegar. No meio de tanta ansiedade, começaram a pensar que talvez não viesse ou que se calhar viria negativa. Então o jovem casal combinou que mesmo que a resposta fosse negativa não iam desistir e o Zé prometeu à moça que se não fosse autorizado o namoro ele a levaria no Minor, para a sua casa (entenda-se casa dos pais dele).
Finalmente lá chegou a carta e para desespero do jovem casal a resposta foi negativa, afinal a moça só tinha quinze anos e o pai achava, dizendo isso mesmo na carta que mandou escrever que ela era demasiado nova para namoros, aconselhando a espera de mais dois ou três anos e depois sim, teria idade para namorar.
Como veremos a seguir, não haveria maior engano.
Tal como diz o poeta, o coração tem razões que a própria razão desconhece.
Não querendo perder mais tempo, o Zé, começou a preparar os seus pais para o que iria acontecer, também ele agora precisava da autorização, para trazer a moça para a casa deles.
A coisa também esteve difícil lá para esses lados, chegando mesmo o moço no ímpeto da sua paixão, a ameaçar os pais de sair de casa, caso não lhe fosse dada a autorização para trazer a moça.
Não foi necessário chegar a tanto porque finalmente na manhã de Sábado, dia 28 do mesmo mês de Agosto, foi comunicada pela mãe do Zé a tão ansiada autorização. Nessa noite, o Minor voou em direcção à Aldeia, tentando que o seu amigo não perdesse mais tempo.
Encontraram-se os dois namorados na porta da casa da moça, logo ali combinaram que nessa mesma noite haviam de partir os três em direcção à casa do Zé.
Tudo combinado, o Zé e o Minor fingiriam abandonar a aldeia, mas ficariam no final da rua de baixo aguardando a chegada da moça que por seu lado sairia um pouco mais tarde de casa dirigindo-se no sentido oposto ao da partida do Minor, fingiria ir até à casa de uma amiga, depois regressava pela rua de baixo ao encontro dos dois que a aguardavam.
Já passava da meia-noite quando a moça finalmente chegou junto dos dois.
A partir daí, tudo decorreu na maior correria com o Minor, na raça do seu motor “Sachs” a transportar o “raptor” e a “raptada” até à casa do Zé.
Chegados, o Zé tratou de avisar os seus pais com um nervoso “já cheguei” escondendo de imediato, o seu amigo e cúmplice, para despistar qualquer possível perseguição. Sim, não fosse a mãe da moça se abalar lá da Aldeia, à procura dela. E não foi que abalou mesmo!
O que se passou a seguir não interessa para esta história mas sempre quero dizer que passado pouco tempo, devido à sua falta de espaço, para poder transportar o Zé e a Moça, o Minor, seria substituído por uma “Vespa” que durante alguns anos, passou a ser a companheira preferida, do jovem casal.
Quanto ao destino do Minor, perdeu-se nos confins da memória, mas rezam as crónicas que anos mais tarde, também a Vespa que já era pequena para transportar a família que entretanto tinha aumentado, foi substituída por uma “Diane”.
Hoje, passados mais de trinta anos, o Zé, não quer deixar esta história por aqui e numa homenagem à participação destes companheiros na sua vida, dedica-lhes agora, todo o seu respeito e carinho, extensivo a todos os ciclomotores com mais ou menos idade que terão histórias belas e interessantes que valerá a pena recordar.
Nunca é demais lembrar que “quem possui um ciclomotor antigo, possui também um pouco da história” que todos transportam na sua já longa existência.
Gostaria de terminar esta narrativa, com um apelo que me parece de extrema importância:
-Nunca confundam “velho” com “antigo”. “Velho”, é aquele ciclomotor a quem deixaram que o passar do tempo cumprisse o seu impiedoso trabalho de destruir e estragar.
No “Antigo”, o tempo passou mas o carinho e o cuidado de alguém não deixou que esse mesmo passar do tempo, o estragasse. A este podemos chamar “clássico”, ao outro “sucata”.
Nunca deixem que o vosso ciclomotor se transforme em “sucata”, tratem-no com o carinho!
Sintam-se honrados de possui-lo e do privilégio de poder, usufruir da verdadeira sensação de liberdade que só o desfilar com ele, lhes pode dar!

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