23 maio 2014

HISTORIAS DE GUERRA FINAL



Termino as minhas histórias de guerra, com esta foto do destacamento de Bassarel, dos finais de Agosto de 1974, onde se vê o arrear da nossa bandeira, numa cerimónia perante as nossas forças, o PAIGC e a população civil.

Momentos depois no mesmo local seria hasteada a bandeira do PAIGC e nós 3ª. Companhia do Batalhão de Caçadores 4615, terminávamos a nossa missão e abandonaríamos definitivamente o destacamento, deixando para trás alguns dos momentos mais difíceis das nossas jovens vidas.

Por outras palavras este é nem mais nem menos o final desta curta mas muito longa (dois anos) para mim, história de guerra. 

Ficou uma grande história de vida neste esforçado curso de sobrevivência que é a participação não desejada numa guerra de "guerrilhas", num país desconhecido, clima e terra inóspita, com dificuldades de adaptação de toda a espécie, conseguida à custa de muito trabalho e sacrifício.

Pelo meio algumas doenças, como o paludismo, a infecção intestinal e uma fractura de crânio que acabaram por me deixar marcas para o resto da vida.

Da guerra propriamente dita um "ataque ao arame", isto é, fomos atacados dentro do nosso próprio destacamento, felizmente sem qualquer baixa.

Ficaram também algumas sequelas, como aquelas que alguns anos após o regresso ainda nos faziam instintivamente atirar-nos para o chão quando inesperadamente escutávamos qualquer tiro ou o som de um festivo foguete ou aquelas que inconscientemente fazia-nos agredir as nossas companheiras quando a dormir, sonhávamos que estávamos na guerra.

Regressando a Bissau, onde a permanência foi feita na confusão que era o quartel de adidos, apesar de continuar a ser o responsável pela alimentação da companhia, tinha muitas dificuldades em o conseguir, porque eram poucos os recursos e muitos os militares naquele local a aguardar o ansiado transporte para a metrópole, o que no nosso caso só veio a acontecer quase uma semana depois com o embarque no navio que os traria até Lisboa.

Eu, o 1º. sargento Neves e um condutor, havíamos de ficar mais algum tempo até conseguir-mos fechar as contas da companhia e obter os vistos confirmando que tudo estava certo, após o que entraríamos numa lista de espera para o almejado transporte de regresso.

Quase três semanas após o embarque da companhia o meu nome surgiu na lista de embarque numa manhã em que eu desgraçadamente tinha entregue toda a minha roupa militar com a qual podia embarcar, a uma desconhecida lavadeira que não sabia onde encontrar.

Sem tempo para esperar pela lavadeira fui na emergência á intendência militar onde se faziam os espólios e lá arranjei umas calças com umas pernas enormes que tive que cortar e uma camisa. Assim vestido, apresentei-me no aeroporto e embarquei  para Lisboa, onde cheguei nesse dia à noite.

Ainda nessa noite apresentei-me no quartel de adidos, consegui o passaporte militar, apanhei o comboio, terminando a viagem na manhã do dia 29 de Setembro, na minha cidade de Faro.

Sem honra nem glória que tão pouco procurava,  encerro este capitulo de histórias de guerra.